Documento da Frente Nacional dos Territórios Quilombolas na Cúpula dos Povos

25/06/2012 12:26

Documento da Frente Nacional  dos

Territórios Quilombolas na Cúpula dos Povos

Combate ao Racismo Ambiental

Foto: Google Imagens

Considerando que o a Cúpula dos Povos na Rio+20  será um processo de construção  de diálogos e convergências  para construção das verdadeiras soluções sustentáveis  e para a  mobilização de lutas que unifiquem bandeiras  em torno da Luta por Direitos e  da Justiça Social e Ambiental, propomos :

  1. A luta contra o racismo como causa estruturante da divisão desigual do trabalho e dos acesso aos bens comuns, o racismo ambiental, bem como das constantes ameaças aos territórios quilombolas e indígenas, os assassinato de várias lideranças, a  expulsão dos mesmos de seus territórios e processo de violência e genocídio dos povos negros e indígenas no campo e na cidade.
  2. A luta por Direitos e por Justiça Social e Ambiental  no país, desvendando engodos e hipocrisias, sempre atualizados, dos discursos oficiais da data de 13 de maio e denunciando sobretudo o Genocídio da Juventude Negra, o Racismo Institucional e Ambiental, a ADI 3239 do DEM contra os Quilombolas no país e a tentativa de desconstituição das Ações Afirmativas; referendando o 20 de Novembro, Aniversário da Morte de Zumbi, como o principal dia de LUTA E RESISTÊNCIA NEGRA E QUILOMBOLA NO PAÍS .
  3. A defesa da luta pela terra com Reforma Agrária por parte de todas as camadas populares rurais em seus territórios no campo, denunciando o uso excessivo de agrotóxicos causador de graves crimes ambientais, Contra o Latifúndio e pela Soberania Territorial e Alimentar no país, Pelo Limite da Propriedade da Terra;
  4. Luta contra os retrocessos do Sistema Ambiental no país, sobretudo o debate sobre o Código Ambiental, a Questão das Mineradoras no país e dos mega empreendimentos como as Usinas Nucleares e de Belo Monte, todos estabelecendo conflitos diretos com os Territórios indígenas, quilombolas e demais Povos e Comunidades Tradicionais causando risco e afetando a vida destas Populaçãoes e da  População como um todo;
  5. Luta por uma política pública construída com participação e democracia reais, incluindo a Defesa dos Territórios nas cidades que sofrerão com os impactos sócio ambientais dos Megaprojetos da Copa 2014 defendidos pelo governo em parceria com o Capital Imobiliário.
  6. Considerando, a completa ausência do estado (executivo, legislativo e judiciário) na defesa do direito das populações empobrecidas rurais e urbanas e pesada atuação do estado na defesa e estruturação do grande capital, seja por meio de formas, cada vez mais recorrentes, de incentivo e gerenciamento dos grandes investimentos em:
  • agrocombustíveis;
  • mineração;
  • utilização comercial da água;
  • matriz energética;
  • monocultivos e novo código florestal;
  • infra-estrutura a serviço prioritário do grande capital em todas as suas formas.

Identificamos como causas estruturais como resultados das Parcerias Publico Privadas entre o estado e as grandes corporações:

  • flexibilização por parte do estado do sistema ambiental; o racismo ambiental e suas conseqüências para os povos negros e indígenas no Brasil .
  • manutenção da estrutura de apropriação privada da terra, de seus recursos naturais e dos meios de produção;
  • criminalização dos movimentos, organizações e lideranças socioambientais autônomas;
  • sistemática negação e manipulação das informações, da participação nos instrumentos conquistados para o exercício do poder por parte de comunidades e cidadãos, pelas restrições legais que impedem comunidades e movimentos sociais de possuir meios de comunicação de massa como rádios comunitárias e emissoras de TV.
  • Os iminentes ataques e violações aos direitos dos povos e o crescimento da violência, assassinatos e ameaças de quilombolas, indígenas e demais populações tradicionais, assentados e atingidos por barragens, mineradoras e grandes empreendimentos do agronegócio e do capital imobiliário no campo e na cidade, mega projetos e empreendimentos do capital no Brasil e no Mundo.

Desta forma, nos propomos a enfrentar, articulada e coletivamente, estas situações, através de uma Frente Negra e Popular em Defesa dos Territórios ameaçados no Campo e na Cidade.

Das discussões realizadas no FST2012 em Porto Alegre, foi sentido no ânimo e intencionalidade da Frente que este é um momento de se fortalecer junto às bases, enquanto espaço pluralista de articulação de diversos grupos, organizações, movimentos que atuam nos diversos territórios do país, tendo como pano de fundo a luta contra as Sociedades Patriarcais, Racistas e homofóbicas  e o enfrentamento dos problemas  socioambientais, incorporando outros valores que permitam superar a desumanização e o degrado do atual modelo de crescimento economicista e provocador de sempre novas vítimas no âmbito das relações humanas e com o da vida no planeta terra . Nesse sentido apontamos para uma agenda que identifique as falsas soluções como a chamada economia verde, uma versão do capital que produz falsas soluções ambientais única e exclusivamente direcionadas para o processo de acumulação e de dominação das grandes empresas, apropriação dos bens comuns e de sequestro das reservas naturais em prol da acumulação capitalista.

Dessa forma, a desterritorialização das populações empobrecidas, de povos e comunidades tradicionais no campo e na cidade é parte de um projeto que se consolida com as prioridades de investimentos em mega projetos como opção dos governos ditos progressistas, mas que, na prática, criminalizam os movimentos sociais ou fazem a cooptação de lideranças na tentativa de enfraquecer o enfrentamento dos povos organizados frente à conjuntura posta. Portanto uma tentativa criminosa de desarticulação e violação dos direitos, a exemplo da recente aprovação da PEC 215, projeto dos ruralistas que dá poderes ao Congresso de demarcação de terras indígenas e quilombolas, bem como a questão das reservas ambientais aprovado na Comissão de Constituição e Justiça, sob pressão dos ruralistas e do julgamento da ADI 3239 no Supremo tribunal Federal. Ou seja, num ano eleitoral, moedas de troca que beneficiam apenas as grandes corporações e o agronegócio com setores do governo Dilma, diretamente envolvidos nestes processos.

Dessa maneira, a construção da Cúpula dos Povos para a  Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas, vem sendo um caminho de articulação, de diálogos e convergências, que poderá assegurar uma ampla mobilização e espaço de articulação de diversos setores na construção de umProjeto Politico de Reparação Histórica e Humanitária  dos   Povos  em seus direitos humanos, territoriais,  étnicos, à cidade, aos bens comuns para o Combate ao racismo ambiental e o acesso a Justiça Social e Ambiental  como eixo centralizador deste evento .

De fato as populações historicamente marginalizadas reinventam na sociedade brasileira e mundial  as suas relações de trabalho e convivência sócio-ambiental,  a causa da repulsa da elite latifundiária deste país tão bem representada no partido político que patrocina a Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o Decreto 4887/2003; como o embate no mundo jurídico está sendo identificada como um entrave  para a efetivação do direito; e os descompassos entre o discurso governamental e os números dos orçamentos públicos destinados a garantia das terras necessárias à reprodução física, social, econômica e cultural dos quilombolas  são causas estruturais  que  afetam diretamente  a vida dessas comunidades.

Causas Estruturais, Falsas Soluções e Nossas Soluções Historicamente Construídas. 

Dos séculos XVI ao XIX, formaram-se, bem como foram destruídos, inúmeros quilombos em todo o território nacional em formação, de tal modo que já não se encontravam apenas nas matas interioranas ou cabeceiras de rios, ao contrário, estavam espalhados ao longo de estradas e próximos a vilas que com os quilombolas firmaram alianças comerciais. No contexto do sistema escravocrata, os quilombos se constituíram como espaços da liberdade e comunhão. Essa situação não autoriza que alguém se surpreenda com estimativas que dão conta de cerca de três mil comunidades que talvez se caracterizem como remanescente de quilombo.[i]

O fim legal da escravidão nestas terras, em 1888, não significou para a população negra o fim do cativeiro real, haja vista que com as terras já “escravizadas” pela Lei 601/1850, restaram-lhes como alternativas: permanecerem submissos aos seus antigos senhores; lançar-se à rua da amargura sem qualquer assistência ou sustento; e a formação de novos quilombos como alternativa ao modelo concentrador de terras, riquezas, cultura, etc.

Se para os negros aquilombados ali era o espaço para reprodução livre de um modo de vida e como sinal de protesto às condições desumanas e degradantes a que estavam sujeitos os escravos, para a sociedade dominante e suas elites o quilombo continua sendo lugar de fora-da-lei. Desse modo, “a categoria quilombo, como objeto simbólico, representa um interesse diferencial para os diversos sujeitos históricos de acordo com sua posição em seus esquemas de vida” [ii].

A luta e conquista de um aparato jurídico constituído pelo critério de auto-atribuição dos grupos étnicos – foi adotado pela Convenção 169/OIT e, posteriormente pelo Decreto 4887/2003, para dar efetividade ao art. 68 ADCT, no que diz respeito à definição do grupo étnico a ser beneficiado e aos limites das terras a serem tituladas pelo Estado em nome dos mesmos grupos étnicos.

Nesse contexto, as terras dos remanescentes de quilombo não se apresentam apenas com um aspecto patrimonial, em uma perspectiva econômica. Cuida-se, em verdade, do espaço onde se desenvolvem um conjunto de práticas sócio-ambientais que estão imbricadas na constituição da identidade desses grupos e dos sujeitos que os integram, afigurando-se, além de moradia (art. 6º,caput, da CF/88), como patrimônio cultural. Assim, a proteção dessas terras é uma exigência para a afirmação da dignidade humana de um grupo étnico, portador de especial papel na formação histórica brasileira, essencial para a sua persistência.[iii]

Deve-se esclarecer que a posse exercida pelas comunidades tradicionais quilombolas é uma posse étnica, existência esta baseada em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições ecológicas locais e que desempenham um papel fundamental na proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica, conforme preceitua o art. 20 da lei nº 9.985/00.

Essa territorialidade, marcada pelo uso dos bens comuns, é submetida a uma série de variações locais que ganham denominações específicas, segundo as diferentes formas de autorepresentação e autodenominação dos segmentos camponeses, tais como Terras de Santo, Terras de Índios, Terras de Parentes, Terras de Irmandade, Terras de Herança e, finalmente, Terras de Preto.

Área de uso comum é “um bem não sujeito à apropriação individual em caráter permanente.Nestes espaços combinam-se as noções de propriedade privada e de apossamento de uso comum, onde encontra-se um grau de solidariedade e coesão social, formadas a partir de normas de caráter consensuais que garantem a manutenção destes espaços”. São áreas cujos recursos são abertos, inalienáveis e indivisíveis. O acesso à terra para o exercício de atividades estritamente familiares, em parcelas da área de uso comum, só é permitido pelo conjunto de moradores para fazer casa, roça ou extrativismo, mas não para apropriar-se da área de uso comum em si.[iv]

Esse modus vivendi dessas comunidades está construindo uma nova visão e abordagem da direito de propriedade da terra. De fato, a propriedade privada da terra e demais bens da natureza não só contraria e inviabiliza o uso comum dos recursos estabelecidos secularmente por essas comunidades como acarreta o fim das condições de reprodução desses grupos uma vez que “se constitui a terra como instrumento relevante à afirmação da identidade da comunidade, para a manutenção e continuidades das suas tradições, as formas de acesso a terra, incluem as dimensões simbólicas e as relações sociais” [v]. 

2. DA CONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO FEDERAL 4887/200 E DA DENÚNCIA INTERNACIONAL 

O reconhecimento de propriedade definitiva aos “remanescentes de comunidades de quilombos” é norma constitucional que encontra similitude no direito constitucional do continente americano. Questionamento, por parte de comitês e comissões internacionais cuja jurisdição o Brasil reconheceu competência, no sentido da preocupação com a violação dos direitos das comunidades negras, recomendando adoção de procedimentos para efetiva titulação das comunidades quilombolas. Compromissos firmados e que encontram substrato na “prevalência dos direitos humanos” como princípio regente das relações internacionais.

Na interpretação das normas constitucionais, há que se ter em conta a unidade da Constituição, a máxima efetividade e a eventual concordância, não sendo, em princípio, inconstitucional regulamentação, por decreto, de direitos das referidas comunidades, passados quase vinte anos da promulgação de uma “disposição constitucional transitória”.

Além, a regulamentação, por meio de decreto, que não fere a Constituição, nem constitui espécie de decreto autônomo, quando: a) inexiste, para o caso, expressa previsão de lei em sentido formal, a regular a matéria; b) as Leis nº 7.688/88 e 9.649/98 dão suporte ao procedimento da administração; c) estão presentes todos os elementos necessários para a fruição do direito. Discussão, ainda não pacificada, sobre a existência ou não de “decreto autônomo” ou “independente”, depois da EC nº 32/2001.

Destarte, é constitucional a definição de terras ocupadas por remanescentes de quilombo constante no Decreto 4.887/03. A definição estabelecida pelo Decreto leva em consideração a finalidade essencial do art. 68 do ADCT – permitir que as comunidades quilombolas continuem existindo e vivendo de acordo com seus costumes e tradições – e o sistema constitucional brasileiro, que impõe uma leitura do referido dispositivo constitucional que se harmonize com o art. 215 da Lei Maior, que trata da tutela de direitos culturais. Tal conceito, ademais, está em perfeita consonância com a Convenção 169 da OIT.

Nesta direção, importante julgado dimensiona a constitucionalidade do decreto 4.887/2003:

CONSTITUCIONAL. REMANESCENTES DE COMUNIDADES DE QUILOMBOS. ART. 68- ADCT. DECRETO Nº 4.887/2003. CONVENÇÃO Nº 169-0IT. 

1. DIREITO COMPARADO. DIREITO INTERNACIONAL. O reconhecimento de propriedade definitiva aos “remanescentes de comunidades de quilombos” é norma constitucional que encontra similitude no direito constitucional do continente americano. Questionamento, por parte de comitês e comissões internacionais cuja jurisdição o Brasil reconheceu competência, no sentido da preocupação com a violação dos direitos das comunidades negras, recomendando adoção de procedimentos para efetiva titulação das comunidades quilombolas. Compromissos firmados e que encontram substrato na “prevalência dos direitos humanos” como princípio regente das relações internacionais. 

2. INTERPRETAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO. Na interpretação das normas constitucionais, há que se ter em conta a unidade da Constituição, a máxima efetividade e a eventual concordância, não sendo, em princípio, inconstitucional regulamentação, por decreto, de direitos das referidas comunidades, passados quase vinte anos da promulgação de uma “disposição constitucional transitória”.

3. NECESSIDADE DE LEI. A regulamentação, por meio de decreto, que não fere a Constituição, nem constitui espécie de decreto autônomo, quando: a) inexiste, para o caso, expressa previsão de lei em sentido formal, a regular a matéria; b) as Leis nº 7.688/88 e 9.649/98 dão suporte ao procedimento da administração; c) estão presentes todos os elementos necessários para a fruição do direito. Discussão, ainda não pacificada, sobre a existência ou não de “decreto autônomo” ou “independente”, depois da EC nº 32/2001.

4. CONVENÇÃO Nº 169-OIT. Plena aplicabilidade do tratado internacional de proteção de “comunidades tradicionais”, não destoando o Decreto nº 4.887/2003 de seus parâmetros fundamentais: a) auto-atribuição das comunidades envolvidas; b) a conceituação de territorialidade como garantidora de direitos culturais; c) o reconhecimento da plurietnicidade nacional.

5. QUILOMBOLAS. Conceito que não pode ficar vinculado à legislação colonial escravocrata, tendo em vista que: a) a historiografia reconhece a diversidade cultural e de organização dos quilombos, que não se constituíam apenas de escravos fugitivos; b) a Associação Brasileira de Antropologia-ABA estabeleceu, com base em estudos empíricos, um marco conceitual, a servir de base para o tratamento jurídico; c) o dispositivo constitucional, de caráter nitidamente inclusivo e de exercício de direitos, não pode ser interpretado à luz de uma realidade de exclusão das comunidades negras; d) os remanescentes não constituem “sobra” ou “resíduo” de situações passadas, quando o comando constitucional constitui proteção para o futuro; e) fica constatada a diversidade de posses existentes, por parte das comunidades negras, desde antes da Lei de Terras de 1850, de que são exemplos as denominadas “terras de santo”, “terras de índios” e “terras de preto”.

6. DESAPROPRIAÇÃO. Instituto que não é, de início, inconstitucional para a proteção das comunidades, considerando que: a) a Constituição ampliou a proteção do patrimônio cultural, tanto em sua abrangência conceitual ( rompendo com a visão de “monumentos”, para incluir também o patrimônio imaterial), quanto em diversidade de atuação ( não só o tombamento, mas também inventários, registros, vigilância e desapropriação, de forma expressa); b) onde a Constituição instituiu “usucapião” utilizou a expressão “aquisição de propriedade”, ao contrário do art. 68-ADCT, que afirma o “reconhecimento da propriedade definitiva”; c) existe divergência conceitual em relação à natureza jurídica prevista, que poderia implicar, inclusive, “afetação constitucional” por “patrimônio cultural” ou mesmo “desapropriação indireta”.

7. CARACTERÍSTICAS SINGULARES. Existência de territorialidade específica, não limitada ao conceito de “terras”, mas envolvendo utilização de áreas de uso comum, parcelas individuais instáveis e referenciais religiosos e culturais, a amparar pleno “exercício de direitos culturais”, que não se estabelece apenas com a demarcação, que é mero ato declaratório. Obrigatoriedade de intervenção do Ministério Público no processo. Necessidade de oitiva da comunidade envolvida e conveniência de participação de um “tradutor cultural”, que permita às partes “se fazer compreender em procedimentos legais” ( Convenção nº 169-OIT).[vi]

Além disso, já restou decidido pelo Supremo Tribunal Federal que o Decreto 4.887/2003 é ato normativo capaz de determinar as providências necessárias para a aplicação imediata do direito fundamental esculpido no art. 68 do ADCT da Constituição de 1988.

3. DAS PROMESSAS (AINDA) NÃO CUMPRIDAS PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

A construção do Estado Democrático de Direito deu validade jurídica às chamadas minorias étnicas, tal como as comunidades quilombolas.

Portanto, a Constituição Federal assegura o respeito às minorias e igualdade de todos, sem preconceito de origem e raça, protegendo ainda a cultura brasileira em seus artigos 215 e 216, sob o manto dos objetivos fundamentais da República e do Estado Democrático de Direito.[vii] Deste modo, a Carta Magna de 1988 assegurou em seu texto a proteção das terras que estejam ocupadas pelas comunidades remanescentes de quilombos diretamente no art. 68 do ADCT, estabelecendo que a elas fosse “reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhe os títulos respectivos.”

Inúmeras leis federais e estaduais foram promulgadas para regulamentar a forma de identificação das terras dos quilombos e outorga de títulos de propriedade às comunidades remanescentes.

O Decreto 3.912, de 10 de setembro de 2001, pra efetivar o a titulação das terras de remanescentes de quilombos adotou dois critérios cumulativos: 1) as terras que fossem ocupadas por quilombos em 1888, além disso, 2) as terras que estivessem ocupadas, efetivamente, na data da promulgação da Constituição Federal de 1988[viii]. Ora, essa é uma visão estática da realidade que não admite processos, além de pretender fixar aos fenômenos sociais datas que, nesses casos, têm apenas função didática, na compreensão da antropóloga Leinad Ayes de Oliveira[ix].

Em 2003, um novo decreto (n º 4887) [x], promulgado pelo Presidente Lula, além da incorporação do critério de auto-atribuição dos grupos étnicos, seguindo a Convenção 169/OIT, fez várias alterações no processo de titulação e tirou-o da competência da Fundação Cultural Palmares (FCP) – subordinada ao Ministério da Cultura – e transferiu-o para Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), no âmbito do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Sob este novo procedimento, o FCP tem apenas autoridade para emitir certificação de auto-identificação aos quilombos, o que é um pré-requisito para iniciar o processo de titulação nos termos do Decreto n º 4887.

Em outubro de 2009, o INCRA publicou a Instrução Normativa Nº 57/2009 que estabelece as várias etapas do procedimento administrativo para dar às comunidades remanescentes de quilombos o título para suas terras, ou seja, identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação, a retirada dos ocupantes ilegais, emissão de título e registro das terras.

Além da legislação nacional, o Brasil é Estado Parte na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho[xi], da Convenção Americana sobre Direitos Humanos e da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, que reafirmam os direitos culturais e territoriais dos grupos afro descendentes, bem como os princípios de não-discriminação e igualdade perante a lei.

Com relação ao reconhecimento de povos quilombolas como povos tribais, existe jurisprudência nacional reconhecendo a aplicação da Convenção 169 da OIT para quilombolas na sua qualidade de povos tribais: 

“não pode o Estado negligenciar a proteção constitucionalmente eleita como um dos objetivos fundamentais da Republica Federativa do Brasil, qual seja, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, identidade e quaisquer formas de discriminação” (CF/88, art.3o, IV), incluindo, assim, as comunidades remanescentes de quilombos (…) conforme destacado pelo ilustre Representante Ministerial em seu Parecer, pelo Estado Brasileiro estou confirmando seu entendimento em estabelecer políticas públicas voltadas ao combate à discriminação dos modos de vida tradicionais dos povos indígenas e tribais, quando da edição do Decreto Legislativo No 143/2002, ratificando a Convenção No. 169 da OIT, que dispõe em seu art. 14 que “deverão ser reconhecidos os direitos de propriedade e posse dos povos em questão sobre as terras que tradicionalmente ocupam” [xii]

Conforme parecer AGU/MC nº 1/2006, de lavra de Manuel Lauro Volkmer Castilho, Consultor-Geral da União:

“Assim, quando menciona “aos remanescentes das comunidades de quilombo” o texto do art.68 ADCT quer referir-se aos indivíduos, agrupados em maior ou menor número, que pertençam ou pertenciam a comunidades, que portanto viveram, vivam ou pretendem ter vivido ou viver na condição de integrantes delas como repositório das suas tradições, cultura, língua e valores, historicamente relacionados ou culturalmente ligados ao fenômeno sócio-cultural quilombola. Aliás, as noções jurídicas de remanescentes de comunidade, bem por isso, estão logicamente entrelaçadas ao conceito de quilombo, isto é, ao conceito jurídico constitucional de quilombo [...] As terras ocupadas, nessa medida, são as que ele efetivamente possuem e mais as que sejam suficientemente e necessárias para a manifestação de suas peculiaridades culturais aí incluídas as que sejam necessárias para o natural desenvolvimento e reprodução de sua cultura e valores. A expressão ‘as terras que estejam ocupando’ significa logicamente mais do que a simples dimensão geográfica, atual ou histórica, das comunidades remanescentes de quilombos, posto que- a exemplo das terras indígenas (art 231,§1º da CF), cuja proteção constitucional obedece, tal como aqui, a idêntico princípio de proteção dos formadores da nacionalidade brasileira-constituem tais terras territórios de habitação permanente, utilizadas para as suas atividades produtivas e imprescindíveis para a preservação dos recursos ambientais necessários aos seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução( presente e futura) física e cultural segundo seus usos, costumes e tradições [...] Aos remanescentes das comunidades dos quilombos, como visto, é reconhecida a propriedade definitiva dessas terras que estejam ocupando como indicado. Tal reconhecimento constitucional, que juridicamente tem o significado de atribuir direito e ação ao titular contra todos, implica recusar incondicionalmente a propriedade a quem não seja remanescente de comunidade de quilombos mesmo que esteja ocupando terras em questão e afirmar incondicionalmente a propriedade anterior desses remanescentes quilombolas [...] Destarte, a proteção da posse dos quilombolas independentemente da desapropriação, possibilita que a comunidade continue vivendo no seu próprio território, com segurança jurídica e de acordo com seus costumes e tradições, mesmo diante da eventual demora do Estado no ajuizamento da competente ação expropriatória” [xiii].

Merece acolhida a tese dos Impetrantes, eis que,conforme assentado na decisão que acolheu pedido formulado em sede liminar, o ordenamento jurídico vigente, vocacionado que se encontra para a consolidação de um estado Democrático de Direito, repele a aniquilação de direitos consagrados universalmente, dentre os quais se encontra o direito à sobrevivência. De efeito, não pode o Estado negligenciar a proteção constitucionalmente eleita como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, qual seja, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem,raça, sexo, idade e quaisquer formas de discriminação” (CF/88, art. 3º, IV), incluindo, assim, as comunidades remanescentes de quilombos, máxime quando, conforme destacado pelo ilustre Representante Ministerial em seu Parecer, pelo Estado Brasileiro estou confirmado seu entendimento em estabelecer políticas públicas voltadas ao combate à discriminação dos modos de vida tradicionais dos povos indígenas e tribais, quando da edição do Decreto Legislativo nº 143/2002, ratificando a Convenção nº 169/ da OIT, que dispões em seu art. 14 que “deverão ser reconhecidos os direitos de propriedade e posse dos povos em questão sobre as terras que tradicionalmente ocupam”. Destarte, não obstante a implantação do Centro de Lançamento de Alcântara e o desenvolvimento regular de suas atividades, não podem os Impetrantes ver-se vitimados por este fato da administração, quando o próprio modo de vida tradicional das comunidades quilombolas determinou formas de produção, que foram estabelecidas historicamente visando à sua subsistência.

DISPOSITIVO

ANTE O EXPOSTO, concedo a segurança impetrada, confirmando a liminar anteriormente deferida (CPC 269 I).[1]

O mais novo integrante da Corte Constitucional, ministro Luiz Fux, nomeado pela Presidente Dilma Rousseff, se posicionou, em seu voto (quando ministro do STJ), favorável ao decreto, ao reconhecer que:

 “O Decreto n.º 4887/2003, que prevê o procedimento de identificação, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes dos quilombolas, estatui a caracterização dos beneficiários da norma, bem como a atestação por auto-definição homologada ex post facto, sendo certo, sob o plano fático, insindicável pela Corte, mas coadjuvante no julgamento da causa, que os integrantes da comunidade da área objeto mediato da causa atendem as condições para a caracterização de comunidade remanescente de quilombo“[xiv].

Sobre o referido Recurso Especial, que trata do reconhecimento da comunidade da Ilha da Marambaia como remanescente de quilombos, vale a pena transcrever alguns trechos da inovadora decisão:

(…) Os quilombolas têm direito à posse das áreas ocupadas pelos seus ancestrais até a titulação definitiva, razão pela qual a ação de reintegração de posse movida pela União não há de prosperar, sob pena de por em risco a continuidade dessa etnia, com todas as suas tradições e culturas. O que, em último, conspira contra pacto constitucional de 1988 que assegura uma sociedade justa, solidária e com diversidade étnica. 7. Recurso especial conhecido e provido.[xv] 

3. DO DISCURSO DA ARENA POLÍTICA AOS NÚMEROS DO ORÇAMENTO PÚBLICO

Nunca antes neste país a defesa de povos e comunidades tradicionais, entre as quais as quilombolas, foi tão enfática e aguerrida como nos últimos anos. O arcabouço jurídico acima descrito, trabalhos acadêmicos, inclusão do tema nas grades curriculares, a criação de organismos governamentais em todas as esferas[xvi], a inclusão da questão no trabalho de organizações não-governamentais, etc. elevaram a questão quilombola ao status de questão fundamental na luta pela terra no início deste século.

A pressão de milhares de comunidades quilombolas espalhadas em todo o território nacional estão a demandar a mudança do estatuto jurídico da propriedade da terra. Os instrumentos tradicionais do direito – a posse e o usucapião – são insuficientes e mais do que isso incompatíveis a modo de vida dessas comunidades. Sendo este, sem sombra de dúvida, um dos principais elementos responsáveis pela oposição das elites à titulação dos territórios quilombolas. Essa oposição fica mais explicita quando analisamos os gastos do governo federal referentes à titulação.

O Orçamento Quilombola compreende os Programas do governo federal com Ações destinadas especificamente às comunidades e organizações quilombolas. Em 2011 foram identificados 04 programas, conforme tabela abaixo: 

Tabela 01. EXECUÇÃO DA LOA-2010 / ORÇAMENTO QUILOMBOLA – PROGRAMA BRASIL QUILOMBOLA

  DOTAÇÃO INICIAL AUTORIZADO EMPENHADO LIQUIDADO PAGO
(SUBELEMENTO)
0139 – GESTAO DA POLITICA DE DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO 0 0 0 0 0
0172 – CULTURA AFRO-BRASILEIRA 17.538.096 17.538.096 11.370.449 11.032.803 9.266.906
1145 -  COMUNIDADES TRADICIONAIS 420.000 420.000 0 0 0
1336 -  BRASIL QUILOMBOLA 83.860.371 73.219.371 43.678.362 39.599.267 23.395.638
TOTAL 101.818.467 91.177.467 55.048.811 50.632.070 32.662.544

Vê-se que, apesar de autorizadas despesas em três programas, o governo executou ações em apenas dois. Se consideramos os gastos com relação à dotação inicial os gastos pagos estão na ordem de 35, 07% .

Quando analisamos os gastos do Programa Brasil Quilombola se torna maior o descompasso entre o discurso do governo federal e o mundo real das comunidades quilombolas.

Tabela 2: ORÇAMENTO BRASIL QUILOMBOLA

  DOTAÇÃO INICIAL AUTORIZADO EMPENHADO LIQUIDADO PAGO
(SUBELEMENTO)
0859 – Indenização de Benfeitorias e de terras aos ocupantes de imóveis demarcados e titulados aos remanescentes de Comunidades Quilombolas 54.200.000  43.559.000 

 

 

25.875.325 25.875.323 10.386.063
1642 – Reconhecimento, Demarcação e Titulação de Áreas Remanescentes de Quilombos 10.000.000 10.000.000 4.550.163 3.893.365 3.273.790
2D46 – Apoio a elaboração de diagnósticos setoriais sobre as comunidades remanescentes de quilombos 245.000 245.000 6.600 0 0
2D48 – Apoio a centros de referencia quilombolas em comunidades remanescentes de quilombos 500.000 500.000      
6440 – Fomento ao desenvolvimento local para comunidades remanescentes de quilombos 12.716.000 12.716.000 9.649.069 7.218.372 7.123.580
8215 – Atenção a Saúde das populações quilombolas 1.499.371 1.499.371 1.499.371 1.099.371 1.099.371
8589 – Capacitação de agentes representativos das comunidades remanescentes de quilombos 700.000 700.000 655.000 120.000 120.00
8936 – Apoio ao desenvolvimento sustentável das comunidades quilombolas 3.000.000 3.000.000 464.547 414.547 414.547
8957 – Apoio ao desenvolvimento da Educação nas comunidades 1.000.000 1.000.000 978.288 98.288 978.388
TOTAL 83.860.371 73.219.371 43.678.363 38.719.266 23.275.739

Fonte: SIAF/SIDOR/SELOR/ Arquivo: LOA 2010 – Despesa Execução – Orçamento Quilombola /

Data de atualização dos dados 31/12/2010

Se considerarmos o programa com um todo, os gastos não ultrapassam os 27,75% da dotação inicial, ou seja, de R$ 83.860.371 (oitenta e três milhões oitocentos e sessenta mil trezentos e setenta e hum reais) foram gastos apenas R$ 23.275.739 (vinte e três milhões duzentos e setenta e cinco mil e setecentos e trinta e nove reais), perfazendo 27,75% da dotação inicial. Sendo R$ 10.386.063,00 paraIndenização de Benfeitorias e de terras aos ocupantes de imóveis demarcados e titulados aos remanescentes de Comunidades Quilombolas e, R$ 3.273.790,00 para Reconhecimento, Demarcação e Titulação de Áreas Remanescentes de Quilombos, ou seja, 19,16% e 32,73% respectivamente. Esta a última ação diz respeito a gastos com a estrutura do órgão executor, o INCRA. Esse resultado tem se repetido ao longo dos anos[xvii] apesar da demanda apresentada pelas comunidades quilombolas em todo o Brasil.

É verdade, que há outras ações em execução por vários ministérios do governo, entretanto faltam informações quanto ao volume de recursos aplicados e os impactos dessas ações sobre a vida dessas populações. Porém, sendo a terra o elemento fundamental para a configuração da identidade étnica, sem a qual não é possível a reprodução física, cultural e social, considerando os números do orçamento é pífio o desempenho do governo federal. A que se deve esse fraco desempenho apesar da alta demanda?

Segundo dados da Fundação Cultural Palmares, em todo o Território foram Certificadas 1.624 comunidades quilombolas entre 2003 e 2010; destas 227 neste último ano.

Segundo o INCRA[xviii], “existem 120 títulos emitidos, regularizando987.935,9873 hectares em benefício de 108 territórios, 189 comunidades e 11.918 famílias quilombolas, assim distribuídos:

  • De1995 a2002 foram expedidos 45 títulos regularizando775.321,1193 hectaresem benefício de 42 territórios, 90 comunidades e 6.771 famílias quilombolas. Estes títulos foram expedidos por: FCP (13), FCP/INTERBA/CDA-BA (2), INCRA (6), ITERPA (16), ITERMA (4), ITESP (3) e SEHAF-RJ (1). Destes, 2 títulos do ITERPA foram expedidos a partir de parceria (técnica e/ou financeira) com o INCRA/MDA.
  • De2003 a2010 foram expedidos 75 títulos regularizando212.614,8680 hectaresem benefício de 66 territórios, 99 comunidades e 5.147 famílias quilombolas. Estes títulos foram expedidos por: INCRA (15), INTERPI/INCRA (5), SPU (2), ITERPA (30), ITERMA (19), ITESP (3) e IDATERRA-MS (1). Destes, 16 títulos do ITERPA e 14 do ITERMA foram expedidos a partir de parceria (técnica e/ou financeira) com o INCRA/MDA”.

No que pese a baixa complexidade das legislações estaduais frente a federal e as transferências de recursos do governo federal[xix] as titulações feitas pelos governos estaduais incidem, via de regra, sobre terras públicas, portanto com baixo ou nenhum grau  de conflitividade. Em alguns casos essa opção pragmática tem resultado em áreas insuficientes às comunidades quilombolas que, por essa razão, continuam ameaçadas por latifundiários que as rodeiam.

É fato inconteste que o Decreto 4.887/2003 revigorou a esperança de milhares de comunidades que, reconhecendo sua ancestralidade negra, viram na legislação a possibilidade de viverem tranqüilos e seguros nas terras ocupadas por seus antepassados. Parecia ter chegado o fim da perambulação. Prova disso é a demanda crescente apresentada ao INCRA onde tramitam atualmente 1.057 processos. Entretanto, as alianças firmadas pelo governo do presidente Lula e mantidas no atual com as oligarquias regionais e com o agronegócio estão inviabilizando a efetivação do direito dessas comunidades continuarem existindo.  Este último fator explica o baixo índice de aplicação de recursos destinados no Orçamento da União à titulação dos territórios ocupados por comunidades quilombolas.  Para evitar o confronto com os “novos” aliados o governo tem preferido o trololó dos palanques e holofotes da mídia ao reconhecimento e titulação dos territórios quilombolas.

4. DA VIOLÊNCIA CONTRA OS QUILOMBOLAS NO BRASIL 

As diversas violências contra os quilombolas em todo o Brasil evidenciam um verdadeiro consórcio do etnocídio que tem uma amostra expressa nos números dos conflitos apresentados pela Comissão Pastoral da Terra em seu último número do Caderno de Conflitos no campo:

Número de Conflitos de Terra – 2008/2010

Nota-se, segundo o quadro exposto, que a o número de conflitos envolvendo territórios quilombolas aumentou drasticamente. A materialização desses números refletem verdadeiras tragédias sociais:

COMUNIDADE QUILOMBOLA DE VOLTA MIÚDA, BAHIA 

Em pleno São João, dia 24 de junho de 2011, quando o nordeste voltava sua atenção para as festas juninas, um fato grave não ocupou nossa mídia: o quilombola Diogo de Oliveira Flozina, 27 anos, pai de 2 filhos, teve sua casa invadida por 3 policiais a paisana que chegaram na comunidade de carro comum em pleno meio dia. Testemunhas da comunidade que não desejam se identificar, pela gravidade das ameaças que sofrem, disseram que os policiais mataram Diogo e que ficaram na casa com ele até 14h, quando uma viatura chegou para levar o corpo. Nessas horas que a polícia estava na comunidade, um menor de 15 anos foi espancado e ameaçado de morte por se aproximar do local, que os policiais mantiveram isolado de outras pessoas.

COMUNIDADE QUILOMBOLA BREJO DOS CRIOULOS, NORTE DE MINAS GERAIS

Na madrugada de 20 de agosto de 2011, no Território Brejo dos Crioulos, norte de Minas Gerais, o “segurança” do fazendeiro Raul Ardido Lerário, dono de um dos maiores latifúndios dentro do território quilombola, Roberto Carlos Pereira desferiu duas facadas no quilombola Edmilson de Lima Dutra (conhecido por Coquinho) que foi transferido em grave estado de saúde ao hospital da cidade de Brasília de Minas. O agressor está foragido e, segundo informações, trabalha há mais de 12 anos para o citado fazendeiro. Ele já havia feito ameaças de morte a outros moradores, entre os quais a Zé do Mário. Essa agressão e tentativa de assassinato não é um fato isolado. Empregados do mesmo fazendeiro assassinaram, em 2009, Lídio Ferreira Rocha, irmão de Francisco Cordeiro Barbosa – Ticão, vice-presidente da Federação Quilombola e liderança local. O território quilombola Brejo dos Crioulos se localiza nos municípios de Varzelândia, São João da Ponte e Verdelândia, Norte do Estado de Minas Gerais. A comunidade Negra formada por famílias de ex-escravos ali vive desde o século XIX. Entre 1925 e 1930 por um processo de grilagem de terras, grande parte do Brejo dos Crioulos ficou nas mãos de latifundiários, processo que se consolidou nas décadas de 1950 e 1960. Segundo laudo antropológico,17.302 haformam o território quilombola e destes13.290 ha. estão nas mãos de nove fazendeiros. 

COMUNIDADE QUILOMBOLA AÇUDE, SERRANO DO MARANHÃO, BAIXADA MARANHENSE

As famílias quilombolas de Açude, município de Serrano do Maranhão estão vivendo dias de terror causados pelos latifundiários que se apresentam como “proprietários” do território ocupado há várias gerações por aquelas famílias.  A lista de violência praticada pela família Cadete é extensa: proibição de construir casas, derrubada de casa, de Igreja, proibição de fazer roças, matança de animais das famílias, várias vezes as famílias foram forçadas a entregar os frutos coletados como juçara, bacuri, pequi… invasão de suas casas, tudo isso somado ao fato de anualmente serem obrigados a entregar a metade da produção aos “proprietários” como pagamento pelo uso da terra.  Em razão da construção da casa de Francisco Neres Ramos, 78 anos de idade, nascido e criado naquele território, contra a vontade da família Cadete e também pela decisão de não entregar mais um caroço de farinha aos mesmos, no dia 26 de agosto de 2011, o sr. Ucijara Cadete e seus capangas  foram  até roça de um dos filhos de Francisco Neres Ramos e ameaçou que vai CORTAR  O PESCOÇO  DO MESMO PARA PÔR  FIM À PALHAÇADA  que as famílias estão querendo fazer com ele.

Os dados coletados pela Comissão Pastoral da Terra, relativos a conflitos fundiários envolvendo comunidades quilombolas, ainda que não seja a totalidade do que acontece, é uma amostra significativa do conflito no mundo real.

Tabela  Comunidades quilombolas em conflito

UF Total Terra  Brasil Total famílias Brasil  Conflitos quilombolas Total famílias quilombolas 
AP 49 1496 4 55
RO 24 1390 1 17
PA 99 8855 3 734
BA 43 4327 4 242
MA 170 13071 51 3.795
MG 31 2387 10 751
ES 4 1335 2 1270
RS 5 111 2 62
Total nacional 630   49.500 77 6.926

Em 69 casos estão identificados os que estão em confronto com os quilombolas, assim distribuídos: 34 fazendeiros, 13 empresários, 08 grileiros, 07 mineradoras, 03 governo federal/municipal; 02 policiais; 01 judiciário, e 01 político.  Isso demonstra que há interesses dos mais variados setores da economia sobre os territórios quilombolas.

Em artigo na Revista Capital, de 03/03/2011, Mino Carta afirma que “a escravidão vincou profundamente o caráter da sociedade (sic brasileira). Em outro trecho: “O povo brasileiro traz no lombo a marca do chicote da escravidão que a minoria ainda gostaria de usar, quando não usa, e não apenas moralmente”. Ao nos debruçarmos sobre as formas de violência registradas pela CPT contra quilombolas temos exatamente a mesma impressão. Em 2010 foram: 15 ameaçados de morte; 03 agressões; 03 prisões; 02 intimidações; 01 assassinato 01 detenção 01 humilhação; 01 morte em conseqüência (quilombola atropelado pelo trem da VALE); 01 tentativa de assassinato; 01 tortura; além da destruição de pertences, roças e casas.

COMUNIDADE QUILOMBOLA QUILOMBO DA FAMÍLIA SILVA- PORTO ALEGRE-RS.

O Quilombo da Família Silva, primeiro Quilombo Urbano Titulado do País, no ano de 2009, situado no Bairro Três Figueiras,em Porto Alegre, no metro quadrado mais caro do Rio Grande do Sul, uma das referências de resistência negra e popular, resistindo a todos os tipos de violência do grande capital imobiliário e do racismo institucional, segue sendo perseguido por integrantes da Polícia Militar Gaúcha, que em agosto do ano passado invadiu o território, após sucessivas e seletivas abordagens  policiais truculentas aos membros da Comunidade Quilombola. Na invasão do território houve tortura comprovada em um dos membros da Comunidade, conforme relatório do Comitê Estadual de combate a tortura.

Trata-se de uma forma de quebrar e minar a resistência, com uma estratégia de criminalização  e desmoralização dos Quilombolas na medida em que trata-se de uma referência que as elites insistem em tentar desconstituir. 

COMUNIDADE QUILOMBOLA DE MORRO ALTO – LITORAL NORTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

Comunidade Quilombola com secular tradição de luta e resistência contra o Latifúndio, vem sendo objeto de perseguição e racismo institucional, com lideranças ameaçadas e intimidadas por setores ligados ao Agronegócio e Empreiteiras. O Território foi profundamente impactado por obras de duplicação da BR 101 e somente obtendo medidas Compensatórias contra o DNIT após ajuizamento de Ação Civil Pública, medidas estas ainda não concluídas devido a demora nos procedimentos de consolidação jurídica do Território. A Comunidade, após mais de dez anos do processo aberto perante o INCRA, e com muita mobilização conseguiu a publicação do RTID em março do corrente ano consolidando, apesar das pressões do próprio INCRA, para abrir mão de parte do Território, herdado de nossos ancestrais, uma área de aproximadamente, 4654 ha. Sendo que as pressões aumentaram, bem como, as arbitrariedades do próprio INCRA, que até a presente data não procedeu as notificações dos proprietário não Quilombolas, paralisando o processo, culminando com o envio do mesmo para o INCRA  em Brasília, pelo próprio superintendente Regional, por pressões políticas de parlamentares do PMDB e de Partidos da base do Governo Federal e Estadual refletindo, diretamente, os interesses das Empreiteiras e do Agronegócio na Região. Existe uma campanha belicosa e racista contra os Quilombolas promovida por Prefeitos, Parlamentares, Grande Mídia aumentando, enormemente, o potencial de conflito, ao que se soma a conivência do próprio INCRA ao não cumprir com suas atribuições legais.

O Presidente da Associação, na véspera da inauguração da nova sede da Associação foi ameaçado por um suposto proprietário, acompanhado de Policiais Militares, inclusive de ter a sede demolida e incendiada; placas do INCRA derrubadas, casas de Quilombolas derrubadas ou invadidas e finalmente duas tentativas de homicídio contra o presidente da Associação são invadidas .

COMUNIDADE QUILOMBOLA DE SÃO ROQUE – SC.

A Comunidade Quilombola de São Roque, situada no Município de Praia Grande em SC na divisa com Rio Grande do Sul, ocupa , secularmente o território. Na década 70 , com a criação do Parque dos Aparados da Serra uma parte da comunidade ficou em sobreposição com o mesmo.  Na atualidade os Quilombolas vem enfrentando sérias dificuldades com o ICMBIO, que vem agindo de forma truculenta com as famílias Quilombolas  que encontram-se impedidas de reproduzir suas atividades tradicionais, que , salvo melhor juízo, são as responsáveis pela área estar preservada. Os quilombolas estão impedidos de manter suas roças, criar os seus animais e inclusive de reparar suas casas , com a aplicação de pesadas multas, intimidações , invasão de moradias, queima de galinheiros, prisões e uma série de violências. Não foi esclarecida a relação de funcionários do ICMBIO com uma ONG, chamada ONG Iguaçu, que explora atividades turísticasem Parques Nacionaisque inclusive fundamentou um contra-laudo ao Laudo Antropológico da Comunidade. Os Quilombolas construíram um termo de uso sustentável e manejo do território em sobreposição com o parque em epígrafe que sucessivamente é desconsiderado pelo ICMBIO e vem sofrendo forte pressão para aceitar umTermo que desconsidera suas tradições os tornando , praticamente, reféns do ICMBIO.

COMUNIDADE QUILOMBOLA DOS ALPES, PORTO ALEGRE-RS.

Trata-se de Quilombo Urbano , localizado no Município de Porto Alegre, a Comunidade teve duas de suas principais lideranças assassinadas , Joelma e Guinho, e outra ferida,  em Dezembro de 2008, por um jagunço, implantado no seio da Comunidade por um dos principais Grileiros da região.

Até a prisão do Assassino, que ocorreu mais de um mês após os Assassinatos e tentativa de Homicídio, houve a necessidade de um verdadeiro operativo do movimento social negro para garantir a integridade física e moral do território, bem como, para pressionar os órgãos de segurança para efetuarem a prisão do assassino que permanecia nos arredores do Quilombo ameaçando e intimidando a Comunidade. O INCRA já tinha sido informado, em data anterior ao ocorrido, de que havia a situação potencialmente grave e os riscos que os Quilombolas estavam correndo.

O Júri foi realizado no final do ano passado com a condenação do Assassino, Pedro Paulo Back por duplo homicídio qualificado e tentativa de homicídio. Apesar de em depoimento do próprio assassino e de sua esposa de que teriam sido introduzidos no território a mando de empresa imobiliária que disputa o território com a Comunidade, negando o acolhimento pela Matriarca da Comunidade, tal fato foi desconsiderado pelo Judiciário.

O Trauma tem repercussões nefastas até hoje na comunidade. 

COMUNIDADE QUILOMBOLA DO ARAÇÁS, FAZENDA CRUZEIRO, MUNICÍPIO ARAÇAS – BAHIA.

A comunidade denuncia ameaças de morte por pistoleiros a serviço de Mineradoras, com conivência da Prefeitura Municipal e da Petrobrás, com destruição de casas de farinha, sendo a comunidade retirada, sem ordem judicial, estando exposta a todo tipo de violência, além de políticos locais e da Assembléia Legislativa envolvidos. Foram derrubadas quatorze casas, com a perda de vários hectares de roça e destruição de árvores nativas, pomares etc. Fazendo um ano de que esses ataques aconteceram. A comunidade entrou com ação de reintegração de posse, estando no aguardo da decisão judicial. Denunciam que o INCRA que não lhes prestou nenhuma assistência e sendo este conivente com invasores, tampouco qualquer assistência lhes foi prestada pelo MP, Secretaria de Justiça de Estado.

COMUNIDADE QUILOMBOLA RIO DOS MACACOS

(Denúncias de mais um crime da Marinha Brasileira contra negros pobres desarmados)

A Comunidade Quilombola do Rio dos Macacos, localizada no município de Simões Filho, grande Salvador, tem em sua história mais de 300 anos de ocupação territorial, memória e ancestralidade africana. Na década de 1970, a Marinha do Brasil invadiu parte do território quilombola para construir uma Vila Residencial da Base Naval, local destinado para hospedagem de grandes figuras públicas. A chegada da Marinha Brasileira neste território significou grande violência para a população que nele vivia tradicionalmente, pois impôs a destruição de casas de farinha, terreiros de candomblé, pomares e roças, instaurando a insegurança alimentar e educacional aos moradores.

Os conflitos entre a Comunidade Quilombola e a Marinha Brasileira estão pautados na disputa territorial e na expulsão dos moradores tradicionais. No dia 04 de março de 2012, com a desculpa de ampliação da Vila Residencial, a Marinha promoveu uma primeira tentativa de remoção dos moradores, ação que foi interrompida pelos movimentos de resistência dos quilombolas e por ações de apoio da sociedade civil.

No entanto, a Marinha Brasileira já tem nova data para retomar suas ações de despejo da população, que será no dia 01 de agosto de 2012. Na tentativa de conter antecipadamente esse processo, a Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas está lançando a campanha “O Quilombo do Rio dos Macacos É Aqui!”, conclamando o Movimento Social e o Movimento Social Negro a transformar o dia 01 de agosto em um dia nacional e internacional de luta contra a remoção dos quilombolas do Rio dos Macacos, contra a violência aos direitos humanos e em favor da titulação imediata dos territórios quilombolas e da reparação histórica dos crimes cometidos pelo Estado contra a população negra e quilombola.

COMUNIDADE QUILOMBOLA DA PEDRA DO SAL

A Comunidade da Pedra do Sal, localizada na zona portuária do Rio de Janeiro, trata-se de um sítio histórico urbano ocupado por negros e negras que sempre trabalharam em atividades do cais do porto e com a venda de quitutes no centro da cidade,  funções fundamentais para o sustento e permanência dessas famílias na referida região. A Comunidade da Pedra do Sal caracteriza-se com um território de memória da ancestralidade africana e de resistência na região, é também o espaço de reconhecida tradição cultural do samba, contando, atualmente, com uma população de 25 famílias.

Os conflitos que envolvem a Comunidade estão relacionados aos embates com a Igreja Católica, especificamente com uma ordem denominada Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência – VOT – e partem da disputa pela propriedade dos imóveis no território quilombola. Há neste histórico um quadro de ofensas promovidas por representantes desta ordem religiosa contra os quilombolas, desdobradas em expulsão por intolerância religiosa e cultural, ações de despejo movidas principalmente por questões de valorização imobiliária – e agravadas pelo contexto dos Megaeventos (Copa do Mundo FIFA de 2014 e Olimpíadas de 2016) – declarações públicas racistas, além de perseguições às lideranças quilombolas. A situação expõe, ainda, a Comunidade a uma série de violências e inseguranças dentro do contexto urbano do Rio de Janeiro, como, por exemplo, os problemas decorrentes do narcotráfico.

COMUNIDADE QUILOMBOLA THEODORO E VENTURA/ SERRA DO SALITRE

Em Minas Gerais, o Quilombo da Serra do Salitre é uma comunidade quilombola que possui uma disputa territorial com a mineradora Vale do Rio Doce, que atualmente ocupa parte do território quilombola. A comunidade possui uma média de 400 famílias e 30% dessas famílias vivem em condições de precariedade habitacional. Nesta região, os quilombolas possuem uma organização cultural extremamente forte expressa nas Congadas que reúnem mais de 1000 famílias nas regiões de Serra do Salitre, Ambrósios e Patos, no sul de Minas Gerais. Várias lideranças, em função dessa disputa, encontram-se ameaçadas de morte, os sítios históricos estão sendo destruídos pela atividade mineradora, com claro objetivo de apagar referências que reforçam a ancestralidade negra/ africana no território. O descaso e o racismo institucional se expressam por meio da falsificação de documentos e na morosidade no processo de demarcação territorial, como reflexo da pressão da mineradora sobre as instituições governamentais.

AGENDAS, CAMPANHAS E MOBILIZAÇÕES:

  •  Emergencialmente, a questão do plano e lutas envolve a Campanha Rio dos Macacos é Aqui, apontando o dia 1.08.2012 como dia nacional de luta considerando ser a data prevista pela Marinha do Brasil promover o despejo da referida Comunidadeem Simões FilhoBahia
  • A Frente deve estimular a construção de plenárias politicas nos estados para preparar não só a ação emergencial da campanha proposta, mas também construir e fortalecer as Associações Locais combinado as demandas
  • Colocando como tarefa central para os militantes da frente e da coordenação o planejamento e construção nos estados deste processo de mobilização coordenado nacionalmente e vinculado às demandas nacionais e locais das comunidades quilombolas.
  • A Frente é uma Organização, autônoma e independente e não poderá ter vínculos organizativos com quaisquer Organizações e/ou Instituições que contrariem a sua Carta de Princípios.
  • Defendemos uma articulação com os Movimentos Sociais do campo e da cidade, uma articulação com os que lutam contra o sistema capitalista para além das cartas de apoio e moções em anexo, uma relação onde possamos garantir a horizontalidade nas nossas discussões , mas também uma disciplina militante na execução das decisões deliberadas.
  • Resistência contra PECS E ADI, ou qualquer outro tipo de leis que firam os interesses e direitos das comunidades quilombolas em especial a PEC 215 e ADI 3239 do DEM, e PDC 44/2007 de Valdir Collato do PMDB de SC.

CONCLUSÃO

Os dados da violência apontam pra uma guerra silenciosa, mas não tanto silenciosa. De um lado estão as luzes e microfones da mídia cantando loas aos grandes projetos, o Estado Brasileiro fazendo todo o possível e o impossível para a implantação desses projetos via regularização de terras griladas na Amazônia, disponibilidade de recursos financeiros públicos para investimentos[xx], atropelamento da legislação ambiental, concessão de liminares de reintegração de posse de imóveis a quem nunca esteve na posse dos mesmos, etc. Do outro lado estão comunidades e povos tradicionais e seus aliados considerados “entraves ao progresso” por isso suas vozes são sistematicamente silenciadas pela mídia dominada pelos grupos oligárquicos.

O recrudescimento da barbárie no campo – cobrança de foro, proibição de camponeses fazerem suas roças, destruição de bens e pertences, destruição de casas, de recursos naturais; envenenamento de fontes de água; ameaças de mortes, prisões, torturas, expulsão; despejos; assassinatos – indica que não apenas Direitos Humanos fundamentais estão sendo violados, mas que se encontra em curso uma ação genocida a medida em que estruturas do próprio estado operam essa violência. Nesse sentido afirma o Prof. Dr. Alfredo Wagner:

“[...] a extensão dos conflitos violentos, não sendo um dado contingente pode se tornar uma ação genocida, entendida enquanto extermínio físico de uma determinada categoria social, simbolizada tanto por indígenas, quanto por posseiros e sem-terra. Esta ação pode se tornar ainda etnocida pela destruição sistemática dos recursos naturais e dos meios de vida, que asseguram a reprodução física e social de uma dada etnia”.[xxi]

Temos, pois, um calvário dantesco, que distancia enormemente a realidade social das comunidades remanescentes de quilombos das promessas (ainda) não cumpridas pela Constituição Federal e dos discursos palacianos.

Entretanto, Os quilombolas do Brasil estão re-escrevendo a história ao desafiar a ordem imposta pelo latifúndio escravocrata que persiste em querer ditas as relações sociais e de produção a ferro e fogo, ainda que o preço imposto  seja a própria vida.

“As nossas lágrimas derramadas hoje, neste mesmo local em que foi assassinado de forma covarde e brutal o nosso companheiro Flaviano, unidas ao seu sangue, todo derramado, haverá de ser a tinta, uma tinta nova, com a qual continuaremos escrevendo a nossa história feita de muita resistência e muita esperança”[xxii].

FRENTE NACIONALEM DEFESA DOSTERRITÓRIOSQUILOMBOLAS

Documento

te a reconhecer territorialidade quilombola – Por Ricardo Verdum

[xix] No caso do estado do Maranhão, os títulos expedidos pelo estado foram feitos através de convênio com o INCRA, que forneceu a quase totalidade dos recursos financeiros necessários.

[xx] Os usineiros, que foram chamados por Lula de “heróis nacionais” receberam do BNDES mais de R$ 28 bilhões.

[xxi] Chacinas e Massacres no Campo. Mestradoem Políticas Públicas da Universidade Federal do Maranhão. São Luís, 1997.p 21

[xxii] Testemunho de Gregório, conhecido como Gorel, na Romaria da Terra, por ocasião do 30º dia do assassinato/martírio de Flaviano Pinto Neto, no dia 29/de novembro de 2010, em Charco – São Vicente Férrer.