Deseducando Ribeirão Preto

27/08/2010 22:06

Deseducando Ribeirão Preto

 * Romilson Madeira

Um dos pilares da perpetuação do racismo é a escola. Nela são produzidas e reproduzidas as mais variadas formas de discriminação que um indivíduo pode sofrer. Em Ribeirão Preto, a própria Secretaria da Educação patrocina esta realidade ao transformar o que era uma vigorosa política pública em brincadeirinha de “faz de conta”.

O fato é que vemos hoje o Projeto Baobá, criado para concretizar a implantação da Lei Federal 10.639, que torna obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira, ser jogado por terra em função da incompetência e da evidente falta de compromisso com a causa dos negros por parte de quem deveria ser o seu principal defensor e líder.

Em bem pouco tempo, a atual gestão, que tem como chefe do executivo uma prefeita já acusada de intolerância religiosa contra as religiões de matriz africana – como publicado nos jornais locais -transformou os grandes avanços, conseguidos no passado recente, em um teatro dos mais risíveis.

Uma nota triste, com certeza a mais triste desta realidade, é a presença de negros - uns letrados, outros nem tanto - no comando desta chacina dos direitos dos afrodescendentes. Nada justifica esta conduta por parte deles.

A escolha destes negros não pode ser considerada ideológica em função do atual governo já ter mostrado, em várias oportunidades, a aversão que tem pela questão do combate ao racismo.

A falta de compromisso com a promoção da história e cultura africana e afro-brasileira é tão evidente que recentemente realizaram um show de uma “filarmônica afro”, dentro de uma programação conhecida como “Consciência Negra o Ano Todo”, como se fosse possível a qualquer ser humano com um mínimo de conhecimento considerar esta manifestação artística como cultura negra.

Fora esta tentativa de negação explícita da “consciência negra”, o que vemos é um absoluto imobilismo e retrocesso. Até mesmo a prática da capoeira, presente na rede municipal de educação há quase uma década, foi retirada por este governo.

Talvez alguém possa se defender dizendo que precisa do “empreguinho público” para engordar o orçamento doméstico. Se for isso, prefiro acreditar na máxima do escritor que afirma que os que não traem os seus princípios por ordens superiores e para estarem empregados "são pessoas que não se curvam diante dos opressores para não mostrar o traseiro para os oprimidos".

Enquanto esteve coordenando o Baobá,  a professora Silvany Euclênio desenvolveu atividades como cursos de capacitação dos docentes, de formação dos profissionais da educação, gestores/as e servidores/as, em Relações Étnicas, Desigualdades Raciais, História e Cultura Africana e Afro-brasileira. Viabilizou bibliografia mínima para uso dos professores e dos alunos; material audiovisual tratando da temática; seminários e palestras e articulação com as outras secretarias da Administração Municipal em ações conjuntas.

O Projeto chegou a ser reconhecido nacionalmente, inclusive por uma das grandes pesquisadoras da questão racial no país, a professora Elisa Larkin Nascimento, que incluiu um texto sobre o trabalho desenvolvido em Ribeirão Preto no livro “Cultura em Movimento – Matrizes Africanas e Ativismo Negro no Brasil”.

Na atualidade, o professor Petean, responsável por implantar políticas de combate ao racismo a partir da Secretaria Municipal de Educação, parece perdido e imóvel. Recentemente ouvimos de uma professora, que obviamente prefere não se identificar “retrocedemos a meras ações pontuais em determinadas datas, e ao compromisso e boa vontade de um ou outro professor, de uma ou outra gestora...”.

O cargo de assessoria para a promoção da igualdade racial na Secretaria de Educação foi uma conquista do Centro Cultural Orùnmilá, na gestão anterior. Mas é bom destacar que não basta mantê-lo, se não for ocupado por pessoas comprometidas.

Nunca é demais relembrar que o Projeto Baobá tem como premissa um conjunto de ações a serem desenvolvidas pela Secretaria de Educação com o objetivo de combater o racismo e promover a igualdade étnico-racial na Rede Municipal de Educação.

O nome do Projeto é o de uma árvore lendária africana - que chega a viver seis mil anos. Em similaridade com a importância do Baobá para a cultura africana, a iniciativa nasceu para superar adversidades e se desenvolver por meio do fomento, nas mentes e nos espíritos, de novos valores que objetivam levar a coletividade a uma relação de respeito e valorização da diversidade.

Em Ribeirão Preto, a deseducação pública municipal tenta conseguir o que a nem a natureza se mostra capaz. Destruir um Baobá antes que ele cresça e se solidifique.

 

*Romilson Madeira, jornalista e professor universitário.

Ex-assessor de Promoção da Igualdade Racial de Ribeirão Preto