Marcelo Dornelles: "PEC 37 é uma clara mobilização para tentar ofuscar o Ministério Público’.

01/05/2013 00:28

Marcelo Dornelles: "PEC 37 é uma clara mobilização para tentar ofuscar o Ministério Público’.

A PEC 37 "é incompreensível e claramente não há nenhum interesse público ou republicano nisso”, diz o Subprocurador-Geral de Justiça para Assuntos Institucionais.

Adital/IHU

A PEC 37, que limita o poder de investigação do Ministério Público – MP, é proposta por uma "parcela da classe política incomodada com nossa atuação de fiscalização, e pelos delegados de polícia incomodados com nossa atuação investigativa em casos importantes e de repercussão, especialmente em áreas de menos atenção dos trabalhos policiais”, diz Marcelo Dornelles à IHU On-Line. Para ele, a proposta da classe política deriva da tentativa de ter um "poder a menos para investigá-los, e dos policiais, provavelmente por interesse classista, que se revista de ganho salarial e importância social”. Na entrevista a seguir, concedida por e-mail, ele aponta a PEC é equivocada ao confundir "investigação criminal, que é gênero, com inquérito policial, que é uma espécie de investigação. Este sim, o inquérito, é exclusivo das polícias”.

Na avaliação de Dornelles, a proposta é "trágica” para a sociedade porque "as polícias não conseguem dar conta, nem de forma parcial, dos crimes que são diretamente afeitos à sua atividade, como os praticados contra pessoas, tais como homicídios e roubos. Imagina outros crimes, como corrupção, sonegação fiscal, lavagem de dinheiro etc.”.

Marcelo Dornelles é graduado em Ciências Jurídicas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. Ex-presidente da Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul, é professor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos.

 

Confira a entrevista.

Por que e em que contexto político a PEC 37 é proposta?

Marcelo Dornelles – Em nossa avaliação, a PEC 37 surge em dois contextos bem claros: uma parcela da classe política incomodada com nossa atuação de fiscalização, e os delegados de polícia incomodados com nossa atuação investigativa em casos importantes e de repercussão, especialmente em áreas de menos atenção dos trabalhos policiais.

 

Qual é o aspecto mais polêmico e de maior divergência da PEC 37?

Marcelo Dornelles– É a exclusividade da investigação criminal por parte das polícias, excluindo outras instituições – e até Poderes – de fazer também investigação em casos específicos.

 

Como a PEC 37 está sendo discutida na área jurídica? Quais são os argumentos favoráveis e contrários a ela?

Marcelo Dornelles – A questão jurídica vinha sendo pacificada pelo Supremo Tribunal Federal, que, de forma reiterada, vem decidindo que o Ministério Público pode fazer investigação criminal. Vencida a questão jurídica, passaram à questão política, que é uma tentativa de mudança da Constituição Federal.

 

Qual é o papel constitucional do Ministério Público e o que muda caso a PEC 37 seja aprovada?

Marcelo Dornelles – Dentre outras atividades, estão ligados à questão criminal a titularidade privativa da ação penal pública, o controle externo da atividade policial e o papel institucional de defesa da sociedade. Para exercitar esse munus constitucional, há necessidade de instrumentos. Se o titular da ação depende sempre de outra instituição para exercer a sua função, essa titularidade somente será exercida nos casos em que essa outra instituição, no caso as polícias, decidirem encaminhar os fatos para o MP. O que muda é que ficaríamos limitados a isso.

 

Como a PEC limita o poder de investigação do MP?

Marcelo Dornelles – A PEC limita totalmente a investigação de todos os crimes, pois ela dá exclusividade às polícias. Isso é trágico para a sociedade, pois as polícias não conseguem dar conta, nem de forma parcial, dos crimes que são diretamente afeitos à sua atividade, como os praticados contra pessoas, tais como homicídios e roubos. Imagine outros crimes, tais como corrupção, sonegação fiscal, lavagem de dinheiro etc.

 

Por quais razões pretende-se subtrair o poder de investigação do MP e transferi-lo apenas para as Polícias Federal e Civil? O que muda no processo de investigação e punição de crimes?

Marcelo Dornelles – Essa é uma proposta da classe política, porque teriam um poder a menos para investigá-los, e dos policiais, provavelmente por interesse classista, que se reviste de ganho salarial e importância social.

 

Em que medida a PEC 37 gera insegurança jurídica?

Marcelo Dornelles– Pelo fato de que centenas de investigações importantes estão em andamento, pode ocorrer frustração pela sua aprovação, resultando em grande impunidade.

 

Num contexto em que a política e o judiciário são marcados pela corrupção e impunidade, como compreender a proposta da PEC 37?

Marcelo Dornelles– Realmente é incompreensível e claramente não há nenhum interesse público ou republicano nisso. Não se consegue encontrar nenhum ganho para a sociedade nessa restrição. Há uma clara mobilização para tentar ofuscar o Ministério Público. Confundem investigação criminal, que é gênero, com inquérito policial, que é uma espécie de investigação. Este sim, o inquérito, é exclusivo das polícias.